Algumas linhas sobre comércio local
O comércio local é, ou deveria ser, uma das principais fontes de emprego e de desenvolvimento socioeconómico dos municípios (principalmente dos mais pequenos), capaz de gerar receitas municipais que permitam um melhor e maior investimento em áreas distintas.
Promover o consumo na própria região, assim como dos produtos que nela têm origem, significa um investimento gerador de valorização daquilo que é nosso, dos nossos bens. Ao mesmo tempo, é uma aposta que se assume como plataforma impulsionadora para a riqueza regional e social, não só através das receitas geradas, mas sobretudo da capacidade de gerar postos de trabalho com salários certos, que possam proporcionar bem-estar e melhoraria da qualidade de vida a quem os aufere.
Priorizar o comércio local gera um ciclo de mais-valias, estimulando a circulação de dinheiro e alavancando a economia local, envolvendo simultaneamente os munícipes no crescimento estrutural da sua cidade, vila, aldeia ou região.
Actualmente, manter activo o comércio local requer bastantes sacrifícos, muita burocracia e uma determinada disponibilidade financeira para fazer face não só à tributação exigida, como aos investimentos inerentes à actividade. As rendas dos espaços são hoje um dos “Calcanhares de Aquiles”, senão mesmo a maior ameaça à continuidade do pequeno comércio, a par da concorrência das grandes superfícies comerciais. É certo que nelas existem factores atractivos de ordens diversas, como sejam a diversidade de oferta, a facilidade de estacionamento e estratégias de marketing promocionais, que levam o consumidor a optar pelos grandes centros comerciais e supermercados, em detrimento do comércio de rua. Contudo, existem igualmente estratégias que, a serem desenvolvidas, podem potenciar a atractividade dos centros urbanos, contribuindo para o aumento do fluxo pedonal nas ruas onde o pequeno comércio se desenvolve. A disponibilidade de estacionamento é outra das questões que deverá ser tida em conta, assim como os incentivos ao empreendedorismo e a facilidade de acesso ao microcrédito.
Enquanto consumidores, também nós podemos contribuir para o desenvolvimento deste sector e para uma maior competitividade das empresas locais sendo exigentes. Um consumidor consciente sabe analisar todos os factores que influenciam o preço final de um determinado produto, podendo confrontá-lo com a realidade económica e serviço prestado. Ao procurar as melhores opções, o melhor preço/qualidade, sabendo ouvir sugestões e dando as suas, o consumidor incentiva as diferentes empresas locais a procurar as melhores soluções que visem um maior destaque no mercado, priorizando a qualidade e o serviço.
Como é do conhecimento geral, apesar da sua importância, o pequeno comércio é um sector extremamente sensível e dependente das políticas públicas, tendo sofrido bastante nos últimos anos, votado à sua própria sorte.
Mas vamos a números e ao propósito pelo qual decidi escrever este artigo. O número de lojas de rua fechadas na cidade de Beja é assustador, tendo contabilizado mais de 20 entre a Avenida Miguel Fernandes, a Rua do Vale, Portas de Mértola e envolventes. A maioria apresenta placas informativas de venda ou arrendamento, percebendo-se de imediato, assim que questionados os valores, o motivo pelo qual se mantêm e manterão encerradas. Rendas a ascender 600 euros, até ao máximo de 1000 euros, numa cidade onde a economia local esmorece, onde os apoios ao desenvolvimento do comércio são praticamente nulos, vítimas dos sucessivos anos de desinteresse político, desertificação, abandono da população e da mais recente crise económica. Se comparados estes valores com os valores de renda de um espaço comercial numa grande superfície do interior do país, a diferença não é de todo significativa, existindo espaços onde o valor do metro quadrado para arrendamento se situa entre os 5 e os 15 euros, significando 500 a 1500 euros/100 m2. (Como nota informativa, na região de Lisboa, excepção feita aos Retail Park, o valor do m2 nas maiores superfícies pode atingir máximos de 90 euros e mínimos de 40. Se no centrarmos na Avenida da Liberdade, umas das principais artérias e a mais cara no que respeita ao comércio de rua, facilmente encontramos valores médios na ordem dos 35 euros/m2 para arrendamento ).
É preciso inverter esta tendência e sermos nós, cidadãos locais, a contribuir para a mudança.
Queremos mais e melhor, é certo, mas também somos nós os primeiros a condenar o que de novo nasce e se tenta enraizar. Procuramos para lá das muralhas do nosso castelo, o que estando cá dentro já não é tão bom assim, lamentando-nos sobre a desertificação do nosso centro urbano, quando somos nós quem o vê definhar e deixa morrer.
Acima escrevi que “priorizar o comércio local gera um ciclo de mais-valias, estimulando a circulação de dinheiro e alavancando a economia local, envolvendo simultaneamente os munícipes no crescimento estrutural da sua cidade, vila, aldeia ou região”. E é disto que Beja precisa. Da envolvência e luta dos seus cidadãos, neste e noutros aspectos essenciais à sua manutenção e crescimento.